terça-feira, 31 de março de 2009

Mais do Mesmo: Ao Vestibular, Calouro!

Pelo desempenho apresentado nos testes e na corrida de domingo, ficou claro que a McLaren terá muito trabalho em 2009. A equipe não tem um bom equipamento em mãos, ficou com medíocres 14º e 15º lugares na classificação de sábado e ainda sofreu com a punição aplicada a Lewis Hamilton, que trocou o câmbio e acabou iniciando o GP Austrália na 18ª posição.

A perspectiva para esse início de temporada não é muito diferente. O próprio Hamilton admitiu ontem que o GP Malásia, disputado no próximo fim de semana, deve sublinhar ainda mais as deficiências, sobretudo na parte aerodinâmica, do MP4/24. A equipe deve passar as próximas etapas largando do meio ou do fundo do grid e forçando Heikki Kovalainen e Hamilton a avançarem entre o pelotão.

A condição acima ambienta um desafio ao qual Lewis nunca esteve acostumado na F-1. O atual campeão já chegou à categoria num carro extremamente competitivo, brigando por pódios e, posteriormente, por vitórias e pelo campeonato. Hamilton era uma espécie de calouro que ingressou na universidade sem passar pelo vestibular. Apesar da competência, Hamilton deixou no ar a sensação de que ainda precisa provar alguma coisa, e mesmo seu título em 2008 não lhe posicionou como piloto completo no imaginário geral da F-1. Para muitos, falta a Hamilton o aprendizado de penar com um carro ruim, partir do fim do grid e impressionar em condições adversas. Essa etapa de aprendizagem a qual todos os seus colegas de pista foram submetidos foi queimada por Hamilton, que já estreou no consagrado cockpit da McLaren brigando por vitórias.

Em Melbourne, partindo da 18º colocação, o inglês cruzou a meta de chegada no 4º posto, que acabou virando 3º. Em que pesem os inúmeros incidentes que tiraram vários carros da corrida, foi uma das poucas chances que o universo da F-1 teve de ver Hamilton vindo de trás e fazendo uma corrida limpa.

Será 2009 a chance de Hamilton justificar em definitivo a histeria da torcida inglesa e provar que também é bom vindo do fundo do grid?

É ano de vestibular, de decisão, e de extrema dedicação para o calouro campeão.

segunda-feira, 30 de março de 2009

Austrália Memories: 2001

Dúvida anotada nos Cadernos

Melbourne, início de outono no hemisfério sul, abertura do mundial de F-1 de 2001.

A temporada começava ainda sob o impacto do ano anterior. Meses antes, Michael Schumacher conquistara seu primeiro mundial de pilotos pela Ferrari, primeiro título da equipe desde Jody Scheckter em 1979, devolvendo assim a auto-estima aos tiffosi.

A McLaren, grande rival e única capaz de figurar no imaginário como equipe capaz de barrar o bem-nascido F-2001, prometia fazer oposição forte ao conjunto italiano, promessa não cumprida ao longo do ano.

Schumacher fez a pole e venceu, seguido por David Coulthard e Rubens Barrichello. Mika Hakkinen, grande adversário do alemão nas temporadas anteriores, não completou a corrida.

Mas o fato que mais chamou atenção durante a corrida não foi a tranqüila vitória do alemão da Ferrari, nem o abandono de Hakkinen, nem a corrida de recuperação de Rubinho, que largou mal e chegou a ocupar a 5ª posição. Foi o assustador acidente entre Ralf Schumacher e Jacques Villeneuve ainda no início da prova.

Visivelmente mais veloz, Villeneuve se aproximou rapidamente do alemão da Williams. Numa curta reta da pista de Melbourne, o canadense embutiu sua BAR na traseira de Ralf. A sobra de velocidade de Jacques era tamanha que o canadense se aproximou demais do carro do Schumacher caçula. Os dois colidiram, o carro de Villeneuve levantou vôo e os destroços se espalharam por toda a parte.



A terrível conseqüência da incrível batida foi a morte de um comissário de pista atingido pelos detritos voadores provenientes da batida, além de ferimentos em cerca de uma dezena de espectadores que se encontravam nas imediações do local do acidente. Foi a última vez que alguém morreu numa pista durante uma corrida de F-1.

Ou seja, os últimos anos foram de tanta evolução na segurança da F-1 que os dois pilotos envolvidos num acidente pavoroso como esse saem ilesos, enquanto um indivíduo localizado fora do carro perde a vida. Quer dizer que é mais seguro estar dentro de um carro durante a corrida do que estar nas proximidades assistindo a ela?

Eu rodo, rodo, e acabo voltando aos questionamentos levantados pelo Daniel Médici, do blog Cadernos do Automobilismo, que são, evidentemente, muito ricos em matéria de complexidade do conteúdo, além de inquietantes. Pergunta o Médici: “se a higiene extrema já chegou a Fórmula 1, por que continuaríamos assistindo suas corridas? Para engordar os bolsos de outros homens de terno?”

Eu não sei. Alguém se arrisca?

Para tentar compreender a discussão em toda sua amplitude é recomandável a leitura de outros dois artigos do Médici, encontrados aqui e aqui. Boa sorte!

domingo, 29 de março de 2009

Austrália - Results & Coments [4]

Enfim, a corrida, a Brawn e tudo mais

A corrida da madrugada ainda vai gerar muitos ecos, quem duvida?

Precisei de algumas horas de recuperação para começar a juntar os cacos, as imagens, os flashes, todas as impressões da corrida da madrugada. O que fica é a sensação de que fui jogado do alto de um prédio mas ainda não terminei de concluir que estou em queda livre (não há aqui nenhuma menção ao caso Isabela Nardoni, que completa um ano hoje. Só percebi a coincidência depois de o texto já estar pronto).

A Brawn venceu a primeira corrida de sua história com dobradinha. É lógico que o feito está na história. Ainda mais por não ser uma daquelas vitórias que resultam de circunstâncias absurdas e sim por ser um êxito de um time que já é apontado como favorito a mais vitórias durante o ano.

Tudo isso na primeira corrida de uma equipe que é descendente de um caos motorizado, a Honda dos anos 2000.

É uma vitória com mais valor do que a dobradinha da BMW em Montreal no ano passado, ocasião em que Kubica e Heidfeld foram beneficiados pelos erros dos pilotos e das equipes grandes em si.

Então é parabéns a Ross Brawn a Jenson Button e, em menor grau, a Rubens Barrichello. Sim, porque o brasileiro cometeu uma série de erros evitáveis, especialmente na primeira parte da corrida. Se chegou em 2º, deve o favor a Robert Kubica e a Sebastian Vettel, de quem falaremos mais tarde.

Por enquanto, o assunto é a Brawn GP.

Button correu sozinho. Não viu Vettel no retrovisor de seu BGP001 porque nem o alemão, nem ninguém conseguiu desempenho paralelo ao seu. Largou e escapou, sabendo que o único com possibilidades de incomodá-lo era Rubens Barrichello. Mas Rubens Barrichello que é bom, nem perto de Button esteve.

O engate errado de marchas na hora da largada fez com que Rubinho ficasse estático por frações de segundo essenciais na hora da partida. Relegado ao meio do grid, Barrichello ainda se envolveu num toque com a McLaren de Heikki Kovalainen. Por uma incrível sorte, o BGP001 de Rubens apenas sofreu uma avaria relativamente amena, enquanto o MP4/24 de Kova abandonou com a suspensão quebrada. Posicionado na 7ª colocação, Barrichello encerrava momentaneamente o sonho de dobradinha da Brawn.

Sebastian Vettel e Felipe Massa agradeciam a Rubinho. Ocupando, respectivamente, o 2º e o 3º lugares, os dois faziam uma corrida que “dava para o gasto”, afinal, nenhum deles tinha chance de se aproximar de Button, que a essa altura já estava a 4 segundos de distância.

Para Massa e para a Ferrari, o GP Austrália se revelaria o pior dos pesadelos. Primeiro, a equipe rubra escolheu mau a estratégia, avaliando, erradamente, que os pneus macios eram os mais apropriados para a 1ª parte da corrida. Em 10 voltas tanto Massa como Kimi Raikkonen estavam com os calçados deteriorados e tiveram que entrar no boxes. Maranello passaria a trabalhar com a arriscada estratégia de 3 pit stops, a despeito das prováveis entradas do Safety Car.

Eis que pouco depois, Kazuki Nakajima acerta o muro de Melbourne rodando sozinho. Inevitável entrada do carro-madrinha no traçado australiano.

Na relargada, Nelsinho Piquet saiu da pista, atolando na caixa de brita. Pôs a culpa nos freios frios por causa do longo período de intervenção do Safety Car, mas sabe que as cobranças vão se intensificar ainda mais na Renault.

Mas Piquetzinho não foi o único a viver momentos delicados no GP Austrália. Giancarlo Fisichella também merece uma citação na sessão que se destina a lembrar das patacoadas da prova australiana. Veterano que é, Físico foi capaz de errar a entrada de boxes da Force India. Sensação de que, sai ano, entra ano, e a equipe indiana continua mergulhada entre as pequenas.

A personagem que mais sofreu, porém, foi a Ferrari. Além da falta de ritmo evidente durante a corrida, a equipe provou que a eficiência do KERS é altamente discutível. O equipamento teve pouca relevância para Massa e Raikkonen na disputa por posições. No fim das contas, nenhum dos dois terminou a corrida, Massa com problemas mecânicos, Raikkonen por bater sozinho no muro e danificar a parte dianteira do carro. Coroaram assim o pior começo de temporada vivido pelo cavalinho rampante em mais de 15 anos.

Quase no fim da corrida, no entanto, ocorreu o lance que decidiu a vida de Rubens Barrichello e determinou sua volta ao 2º lugar da corrida.

No giro 56, Barrichello estava em 4º, já resignado com a posição que, depois de tantos toques durante a corrida, não era ruim. Mas um incidente entre Vettel e Kubica mostrou que a sorte estava do lado do brasileiro em Melbourne.

Kubica, em 3º, com mais desempenho e pneus menos gastos, se aproximou rapidamente de Vettel, em 2º, que sofria com o desgaste dos compostos. Os dois dividiram uma curva lenta da pista e saíram tracionando lado a lado. Vettel, afobadamente, decidiu que tinha direito de ir empurrando Kubica para fora do traçado. O polonês, não menos burramente, teimou em se manter ao lado do alemão. Resultado: o toque que retirou as asas dianteiras de ambos. Fim abrupto e desnecessário para dois dos mais elogiados pilotos do grid.

Do lado positivo da corrida, Nico Rosberg mostrava-se um ferrenho batalhador que não se intimidou diante da Ferrari de Raikkonen ou do carro de qualquer outro adversário. Pena que a escolha dos pneus macios para o terço final da corrida tenha lhe roubado a possibilidade de um pódio.

Outro que surpreendeu positivamente foi Lewis Hamilton. Partindo da 18ª colocação e com o péssimo carro da McLaren, o campeão foi o único das equipes ditas grandes até o ano passado a terminar a prova. O desempenho de Hamilton, porém, deve ser analisado sob a luz das batidas/abandonos de Massa, Kubica, Vettel, Nakajima, Raikkonen, além dos problemas de pneus de Rosberg e da desclassificação de Jarno Trulli que, largando do fim da fila, fez uma corrida valente, mas foi punido por realizar uma ultrapassagem sob bandeira amarela.

Quem, definitivamente, vai deitar a cabeça no travesseiro maravilhado é Sebastian Buemi. O único estreante da temporada conseguiu terminar sua primeira participação na F-1 na zona de pontuação.

O GP Austrália foi, enfim, a corrida dos estreantes!

GP Austrália, após 58 voltas:

1. Jenson Button - Brawn GP - 58 voltas

2. Rubens Barrichello - Brawn GP - a 0s8

3. Lewis Hamilton - McLaren - a 2s9

4. Timo Glock - Toyota - a 4s4

5. Fernando Alonso - Renault - a 4s8

6. Nico Rosberg - Williams - a 5s7

7. Sebastien Buemi - Toro Rosso - a 6s

8. Sebastian Bourdais - Toro Rosso - a 6s2

9. Adrian Sutil - Force India - a 6s3

10. Nick Heidfeld - BMW - a 7s

11. Giancarlo Fisichella - Force India - a 7s3

12. Jarno Trulli – Toyota – punido

13. Mark Webber - Red Bull - a 1 volta

14. Sebastien Vettel - Red Bull - a 2 voltas

15. Robert Kubica - BMW - a 3 voltas

16. Kimi Raikkonen - Ferrari - a 3 voltas (problema mecânico)

17. Felipe Massa - Ferrari - a 13 voltas (batida/problema mecânico)

18. Nelsinho Piquet - Renault - a 34 voltas (escapada)

19. Kazuki Nakajima - Williams - a 41 votas (batida)

20. Heikki Kovalainen - McLaren - a 58 voltas (suspensão)

Austrália - Results & Coments [3]

À Iconoclastia

Iconoclastia (sf): ato de destruir e/ou não respeitar tradições e ídolos.
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A princípio é tudo festa! A Brawn ganhou o GP Austrália, primeira corrida do ano, primeira corrida da vida da equipe, com dobradinha. Jenson Button, dominador, não teve adversários, afinal, o único que poderia lhe incomodar era Rubens Barrichello, que largou muito mal. Sem o companheiro no cangote, Button partiu para uma vitória fácil, já que Vettel, Massa e Kubica jamais puderam sonhar com uma real possibilidade de ultrapassagem. No final, por uma trama do destino, Rubinho papou duas posições e foi comemorar a dobradinha junto com Jenson.

É festa, é oba oba, a F-1 mudou, uma equipe recém-nascida venceu. As antigas forças desabaram perante o ineditismo de tudo o que se viu em Melbourne. Dos 4 carros de Ferrari e McLaren, apenas o de Lewis Hamilton chegou ao final do GP Austrália. É hora de abrir as páginas dos jornais e se deleitar com tudo de novo que a F-1 traz nessa nova temporada, uma temporada que, pelo menos nesse primeiro terço, terá como marca maior a iconoclastia que destitui mitos como o da Ferrari e ídolos como Lewis Hamilton em favor da ascensão da Brawn GP.

Mas até que ponto as coisas realmente são novas nesse filme?

É público, notório e evidente que, há anos, a F-1 deseja se reciclar. Não é de hoje nem de ontem que a categoria tem o desejo de se tornar vitrine de um automobilismo mais aguerrido, mais brigado, mais “na pista” e, por fim, mais emocionante. As corridas vencidas na estratégia e na parada de box tornaram-se o símbolo maior da monotonia que havia se instalado na representante do esporte a motor europeu. Essa monotonia fez com que a F-1 desejasse se parecer cada vez mais com o tipo de automobilismo que se disputa do outro lado do Atlântico, nos Estados Unidos. É a esse cerne, do desejo de se americanizar, que Rubens Barrichello, Jenson Button e Ross Brawn devem agradecer.

Lógico, não tenho a mínima intenção de diminuir o feito da Brawn GP e de todos os envolvidos na curta e já brilhante trajetória da equipe. Tenho sim a vontade de iniciar uma discussão que julgo necessária e que se sobrepõe a tudo isso que aconteceu nas 58 voltas da corrida da Austrália: até que ponto e por que a F-1 tem tanta sede de mudanças e será que o modo escolhido para operar essas alterações é realmente o melhor?

Nos últimos dias, Daniel Médici tem se dedicado a tentar entender como nós, fãs de corridas de carros, temos nos comportado diante da evolução natural que levou o automobilismo a se apresentar da forma atual. A discussão não é superficial, pelo contrário, é profunda e com um nível de complexidade até estranho em se tratando de esporte a motor, como o leitor pode conferir aqui e aqui.

Mas é de questionamentos como esses, levantados pelo Médici, que se parte para tentar entender o carrossel de mudanças que a F-1 viveu nos últimos anos, sobretudo de 2008 para cá, e como essas mudanças podem acabar significando coisa nenhuma.

Foi pela vontade de aumentar o show e de ver o inesperado acontecer que a F-1 passou anos contando com uma comissão que tinha o objetivo de estudar possíveis mudanças que trouxessem de volta as ultrapassagens. O chefe da comissão: Ross Brawn. O engenheiro-chefe da equipe que venceu hoje em Albert Park: coincidentemente é o mesmo Ross Brawn, como o Médici bem lembrou ontem, na minha caixa de comentários, quando discorria sobre a tal “nova” F-1 que se desenha para esse ano: “Ross Brawn era o chefe da famosa comissão de estudos de ultrapassagem, que durante 3 anos elaborou este pacote aerodinâmico que estreou nos carros. Acho que isso explica boa parte dos treinos de hoje.”

Explica, Médici. E explica, obviamente, todo o GP Austrália.

A F-1 desejou romper com a rotineira certeza de que, inevitavelmente e excluindo possibilidades catastróficas, as corridas sempre seriam vencidas pelas mesmas equipes, pelos mesmos pilotos. O conceito de regularidade passou a ser visto como raiz do problema da falta de pulsação das corridas. Mas até onde é desejável o equilíbrio entre emoção e regularidade? A F-1 precisa mesmo ser uma categoria à americana? Isso está presente em sua carga genética?

É lógico que a tentativa de responder a todos esses questionamentos de uma vez só deixa qualquer um atordoado. E parece ter sido justamente esse o problema. FIA, FOM e demais organizadores do campeonato quiseram dar todas as respostas e sanar todos os problemas ao mesmo tempo. E assim construíram um campeonato que pode ser absurdamente enganoso.

Por trás da aparente idéia de que a F-1 voltou a ter a capacidade de surpreender, escondem-se pequenas aberrações e artificialidades que, pouco a pouco, vão sendo incorporadas: hoje em dia o pole já não é mais o cara que dá o sangue com o carro levíssimo na classificação e sequer a volta da pole é a mais rápida do fim de semana. Hoje os pilotos são obrigados a correr com dois tipos de pneus, sendo que um deles é visivelmente inadequado ao asfalto e à pista, tudo para proporcionar mais ultrapassagens e aumentar os índices de “emoção.” Mesmo que o preço seja uma emoção de mentira, como bem vão se lembrar Nico Rosberg, Sebastian Vettel e Robert Kubica.

As artificialidades trazidas à F-1 nos últimos conseguem, de vez em quando, dar a exata noção de como há incoerência entre o que se deseja e o que se tem de fato. A iniciativa de trazer compostos de pneus diferentes e obrigar os pilotos a usar os dois durante a corrida tinha como objetivo proporcionar diferenças de rendimento entre carros e facilitar as ultrapassagens. Hoje em Melbourne o objetivo foi atingido de forma patética. Nico Rosberg teve a corrida plenamente prejudicada e mal conseguia se segurar na pista nas voltas finais, cedendo muitas posições. Sebastian Vettel foi outro que sofreu com os calçados inapropriados e acabou vendendo muito caro uma ultrapassagem que terminou com sua corrida e com a de Kubica. É essa a emoção que a categoria que se orgulha de ser celeiro da técnica de pilotagem quer proporcionar?

E o KERS? Quer maior incoerência do que se anunciar como a categoria mais técnica do esporte a motor mundial e institucionalizar o push-to-pass?

O fato é que a F-1 jamais foi uma Nascar ou uma Indy. O tipo de disputa que existe nos Estados Unidos é muito interessante lá, na América do Norte. A Europa jamais fez questão de disputas indefinidas até o último centímetro. Se acontecesse assim, ótimo, mas o ideal de técnica e qualidade de pilotagem sempre foi colocado acima de todo o resto. A tentativa de fazer a F-1 tornar-se uma Indy do velho continente está apenas produzindo uma cultura de iconoclastia, onde se derrubam mitos para que outros subam. Se continuar a apresentar a superioridade desse fim de semana, a Brawn GP vai encerrar o campeonato muito antes da última corrida, ou seja, todas as mudanças operadas no regulamento vão ser inúteis. A F-1 continuará com uma equipe destacadamente favorita. A única diferença é que, depois de todo o fuzuê pirotécnico que a mudança de regulamento gerou, essa equipe não será vermelha nem prateada.

Se a possibilidade se confirmar, terá ocorrido apenas a substituição de nomes no posto de “equipes grandes.”

Peço licença a Ross Brawn por ignorar e deixar de lado, nesse primeiro momento, a realmente adorável e espetacular façanha de sua equipe. O leitor deve encontrar pela blogosfera e pelos sites especializados, paralelos que deixam claro que o feito da Brawn é absolutamente histórico. O negócio é que o debate sobre as mudanças da F-1 e sobre a forma como essas mudanças são operadas gritava por atenção no meio do oba-oba que se formou em torno da mais nova Ferrari vestida de branco.

Ainda acredito na força de um questionamento infantil e pirracento, mesmo quando todo mundo festeja a “nova” F-1 que começa agora e mesmo não tendo a total certeza a respeito de tudo o que digo aqui. Repito: só acho que o tema clamava por projeção.

Deixe que a Brawn continue a ganhar corridas com a facilidade de hoje e antes do meio da temporada já existirá gente pedindo mudanças e mais mudanças para trazer a emoção de volta. E tudo na F-1 continuará a funcionar da forma como sempre funcionou.

*Sim sim, lendo o post abaixo o leitor irá perceber que eu mudei radicalmente de opinião em cerca de 24 horas. E me reservo a esse direito.

sábado, 28 de março de 2009

Austrália - Results & Coments [2]

A Identidade Brawn

A primeira classificação da temporada, apenas por ser a primeira, já guarda uma série de particularidades entre os torcedores. Costuma ser a primeira oportunidade efetiva de o torcedor ver os F-1 em ação depois do sempre longo período de “férias” da categoria. É uma sessão em que a ansiedade já é naturalmente maior, e nesse caso não só da parte da torcida, mas também dos pilotos, dos mecânicos, e do circo em geral. Apenas por isso, a primeira sessão classificatória já é especial, além de, claro, ser a primeira chance de apurar a geopolítica do paddock. E nesse quesito, a classificação do GP Austrália mostrou definitivamente que há algo de novo na F-1 2009.

Sei não, mas tenho a impressão de que foi qualquer coisa histórica a classificação dessa madrugada de sábado aqui no Brasil.

No princípio, carta fora do baralho, agora, favorita à vitória. A Brawn exibiu tanta superioridade na primeira classificação de 2009 que chega a soar estranho certificar-se de que a primeira fila é toda dela. Jenson Button, espinafrado até aqui nesse blog, dado como piloto sem motivação e como promessa que não aconteceu, é o pole. Rubens Barrichello, veterano, historicamente ignorado pela torcida de seu país, é o segundo. E os dois botaram um caminhão de tempo na concorrência.

Como primeira demonstração oficial da hierarquia da F-1 para 2009, a classificação do GP Austrália deixou uma infinidade de marcas. A primeira e mais óbvia: a Brawn não era blefe. Os dois carros brancos (agora com patrocínio acertado com o Grupo Virgin, que foi especulado como virtual comprador da equipe em janeiro) fecharam todas (todas!) as etapas do treino classificatório na ponta da tabela. Mais rápidos em todos os setores da pista, Jenson Button e Rubens Barrichello disputaram uma classificação particular entre si. A primeira fila inteiramente brawniana é sinal de a nova regra aerodinâmica criou um efeito de bomba de nêutrons a sacudir a categoria máxima. E todo mundo parece ainda se acostumar a esse favoritismo já declarado, mas que ainda aguardava confirmação.

A conquista da primeira fila no grid australiano é o maior reconhecimento que o trabalho de Ross Brawn poderia conseguir. Desnecessário citar mais uma vez os predicados do engenheiro mais cobiçado da atual F-1. Necessário, talvez, é o questionamento: a Honda resolveu sair cedo demais?

Tivesse ficado na categoria, a montadora poderia estar colhendo agora os louros de ser, finalmente, a favorita às vitórias no primeiro terço do campeonato. Esse, afinal, sempre foi o objetivo jamais alcançado pelos japoneses em sua volta à F-1 nos últimos anos. O símbolo maior da mediocridade da Honda nessa década é sua única vitória com Button num GP Hungria confuso, chuvoso e em que alguns favoritos abandonaram e outros ficaram relegados às posições intermediárias. A saída da montadora em dezembro, no cenário de agravamento da crise mundial, não deixa de ser sinal de que medíocre foi pensar em sair da F-1 ao menor sinal da iminência de um prejuízo. Uma dose de paciência e os executivos de olhos puxados poderiam estar diante de uma possibilidade de sucesso paralela a dos anos dourados da empresa na F-1 há 20 anos.

Enfim, a Brawn é favoritíssima amanhã. Resta apenas saber se o ritmo alucinado demonstrado em todos os treinos será mantido na corrida. Se sim, Button e Barrichello disputarão uma corrida isolada entre os dois. Devem chegar uma semana a frente do resto. E depois de fazer história marcando os dois melhores tempos na primeria classificação de sua vida, a Brawn é séria candidata a vencer seu primeiro grande prêmio com dobradinha.

É o maior tapa de luvas que a Honda poderia levar.
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Que Williams que nada! Sebastian Vettel foi quem mais chegou perto da BGP na classificação. Um louvável terceiro tempo na classificação põe o alemão em ótima condição para as 58 voltas de amanhã. É outra daquelas situações cheias de significado que só Vettel é capaz de produzir: sua antiga equipe, com os tais motores Ferrari que eram apontados como foco da superioridade em 2008, ficou para trás logo no Q1. A própria e toda pomposa Ferrari comeu a poeira de Vettel. O companheiro de equipe também ficou (muito) para trás. Por fim, Vettel leva um carro de motor Renault ao 3º lugar, enquanto os dois pilotos oficiais da montadora, com o carro próprio da montadora, sequer chegaram ao Q3.

Ano de regras novas, mas com as mesmas e boas surpresas de sempre.
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Como de costume, a acompanhar Vettel como grande showman da F-1, lá está Robert Kubica. Quarto lugar para o polonês, que continua a dar um banho em Heidfeld. Muda ano, mudam as regras, e a BMW continua a ter em Kubica seu piloto mais regular e competitivo.
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De onde muito se esperava, veio pouco: a Williams foi, de forma relativa, a decepção da classificação. Depois de fazer os dois melhores tempos nos treinos livres de ontem, a equipe inglesa foi discreta na classificação oficial: 5º lugar para Rosberg, 13º para Nakajima.

De toda forma, é notável o ganho de rendimento da equipe de Grove em relação a 2008.
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Toyota no meio do Top-10, dando a impressão de que não basta um difusor eficiente para garantir lugar na ponta.
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Ferrari no meio do texto? Sim, e com algum esforço para estar aqui. Não é confortável a posição do time italiano: 7º lugar para Massa, 9º para Raikkonen. Rumor da vez: os dois vermelhos ficaram no limite do Q2, em 9º e em 10º, e tiveram que suar o macacão para seguir para a superpole. Novos tempos em Maranello.

Não adiantou trazer o KERS, apesar da aparente contribuição que o dispositivo forneceu aos rossos. Perto do desempenho da Brawn, talvez a alta cúpula da Ferrari já comece a questionar a real eficiência do sistema de recuperação de energia cinética.

Porém, jamais se pode desconsiderar os italianos. Nunca se sabe o coelho que os carcamanos podem tirar da cartola e o KERS ferrarista parece ser bem desenvolvido e se integra bem ao conjunto da F-60. Mas mesmo que não haja cartola nem coelho, a Ferrari não é totalmente desconsiderada. É mais um exemplo da tal força psicológica que um nome carrega consigo e sobre a qual falávamos num outro dia. O cavalinho rampante possui essa tal força, é inegável.

Mas, inevitavelmente, a Ferrari já não é mais aquela favorita de 5 meses atrás. O mundo dá voltas...
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Previsão de acirramento da pressão envolvendo o nome de Nelsinho Piquet na Renault. O brasileiro não passou do Q1, ficando com uma indigesta 17ª posição. Depois de passar 2008 justificando os resultados medíocres, levando 18 x 0 na briga de classificações com Alonso e dando desculpas que as vezes eram piores do que o silêncio, Piquetzinho começa 2009 outra vez explicando as razões de um mau resultado. Nelsão, o pai, estava em Melbourne, talvez ciente de que sua presença é necessária para apaziguar a cobrança sobre o filho.

O carro continua ruim, mas a inevitável comparação com o 12º lugar de Alonso coloca Nelsinho numa fogueira. E não há mais a desculpa de que o garoto é estreante.
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Kovalainen 14º, Hamilton 15º. Escancarada a situação de decadência da McLaren. Hamilton, aliás, sequer foi a pista no Q2, ausência justificada pela equipe em razão de um problema de câmbio. Será isso mesmo, ou o time prateado não quis queimar a imagem da estrela?

Fato é que o número #1 no bico do MP4/24 não torna o carro de Hamilton mais veloz. O que era uma mera suposição na pré-temporada materializa-se como uma dura realidade para a McLaren: a equipe foi a que mais perdeu terreno com a mudança radical das regras.
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Na turma que sempre vai embora mais cedo, além do já citado Piquet, há pelo menos uma novidade: Toro Rosso, acostumada a ir ao Q3 no ano passado, não passou do Q1 hoje em Melbourne.

Enquanto isso, a Force India começa 2009 do mesmo jeito com terminou 2008: fim da fila.
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O difusor que tanto deu o que falar mostrou-se um atributo periférico na classificação. Dos 6 carros que usam a polêmica peça (Brawn, Toyota e Williams) apenas a Brawn real e unicamente brigou pela ponta. Garantia, portanto, de que não apenas uma parte isolada do carro a razão do sucesso da equipe, mas o conjunto como um todo.
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Só pelo que aconteceu hoje, a história já vai se lembrar com carinho desse GP Austrália. Cresce a expectativa a respeito do que se dirá no futuro sobre o dia de amanhã. Estamos diante do fim de uma era e iniciando outra?

As 58 voltas do domingo vão nos responder.

Grid de Largada, GP Austrália 2009:

1°. Jenson Button (Brawn), 1min26s202

2°. Rubens Barrichello (Brawn), 1min26s505

3°. Sebastian Vettel (Red Bull), 1min26s830

4°. Robert Kubica (BMW), 1min26s914

5°. Nico Rosberg (Williams), 1min26s973

6°. Felipe Massa (Ferrari), 1min27s033

7°. Kimi Raikkonen (Ferrari), 1min27s163

8°. Mark Webber (Red Bull), 1min27s246

9°. Nick Heidfeld (BMW) 1min25s504

10°. Fernando Alonso (Renault), 1min25s605

11°. Kazuki Nakajima (Williams), 1min25s607

12°. Heikki Kovalainen (McLaren), 1min25s726

13°. Sébastien Buemi (Toro Rosso), 1min26s503

14°. Nelsinho Piquet (Renault), 1min26s598

15°. Giancarlo Fisichella (Force India), 1min26s677

16°. Adrian Sutil (Force India), 1min26s742

17°. Sébastien Bourdais (Toro Rosso), 1min26s964
18°. Lewis Hamilton (McLaren), sem tempo
19°. Timo Glock (Toyota), punido
20°. Jarno Trulli (Toyota), punido
Atualizado em 28/03/09, às 17:04

sexta-feira, 27 de março de 2009

Austrália - Results & Coments [1]

Difundindo uma Idéia

Melhores tempos do dia em Melbourne:

1. Nico Rosberg - Williams, 1min26s0532
2. Rubens Barrichello - BrawnGP, 1min26s1573
3. Jarno Trulli - Toyota, 1min26s3504
4. Mark Webber - Red Bull, 1min26s3705
5. Jenson Button - BrawnGP, 1min26s374
6. Timo Glock - Toyota, 1min26s443
7. Kazuki Nakajima - Williams, 1min26s560
8. Sebastian Vettel - Red Bull, 1min26s740
9. Kimi Räikkönen - Ferrari, 1min26s750
10. Adrian Sutil - Force India, 1min27s040
11. Felipe Massa - Ferrari, 1min27s064
12. Fernando Alonso - Renault, 1min27s232
13. Giancarlo Fisichella - Force India, 1min27s282
14. Nick Heidfeld - BMW, 1min27s317
15. Robert Kubica - BMW, 1min27s398
16. Heikki Kövalainen - McLaren, 1min27s453
17. Sebastien Bourdais - Toro Rosso, 1min27s479
18. Lewis Hamilton - McLaren, 1min27s813
19. Nelsinho Piquet - Renault, 1min27s828
20. Sebastien Buemi - Toro Rosso, 1min28s076

Pitacos Australianos:

- Pouco a comentar, até porque só consegui ver primeira sessão, e ainda assim em condições nada favoráveis. O que dá pra dizer é que se a Brawn, a Toyota e a Williams mantiverem o bom rendimento na classificação e na corrida, a chiadeira vai ser grande. A difusão da idéia de que é o difusor que concede superioridade aos três times vai proporcionar um chororô grande nas outras equipes;

- Ah, a Williams liderou a primeira sessão com força total: Rosberg foi o 1ª, Nakajima o 2º. Marcão não deve estar se contendo, né?

- Um treino, porém, é muito pouco. Na verdade, um final de semana não é o suficiente para afirmar com certeza que há uma nova ordem na F-1. Mas já é interessante imaginar um novo cenário no grid, com as grandes buscando evolução a todo preço;

- Fica assim então: na próxima madrugada rola a classificação, às 3 da matina na Globo. Nada como uma sessão-coruja para começar bem a temporada.

quinta-feira, 26 de março de 2009

A mesma praça, outro jardim: Austrália 2008

Em março do ano passado a Fórmula-1 se perguntava: a Ferrari seria imbatível em 2008? A pré-temporada fora muito proveitosa à equipe italiana e Felipe Massa e Kimi Raikkonen, o então campeão, chegavam a Melbourne na condição de favoritos absolutos. Nada como um grande prêmio tumultuado para estragar as previsões de domínio dos comentaristas!

A outra grande novidade daquela corrida de estréia era o fim do controle de tração. A medida humanizou a pilotagem e tirou os pilotos de seu pedestal inalcançável de perfeição. Era preciso aprender a dosar o pé no acelerador e controlar o carro com perfeição nas saídas de curva. Felipe Massa aprenderia a necessidade de um rápido aprendizado de forma um tanto quanto traumática.

Depois de muita expectativa pela F-1 sem controle de tração, o dia 15 de março viu acontecer a primeira classificação sem o dispositivo em anos. A sessão foi marcada por imagens de um Lewis Hamilton escorregando com as quatro e controlando o MP4/23, para delírio dos mais saudosistas. Muita gente apressou-se em dizer que verdadeira F-1 estava de volta.

Logo no Q1 a Ferrari começou a desenhar o caos que lhe era reservado para o domingo: Kimi Raikkonen, o homem que defendia o título, apresentou um problema mecânico e ficou limitado ao 16º lugar no grid. Um mau começo para quem vinha de uma pré-temporada arrasadora.

Ficou, portanto, para Felipe Massa a expectativa de pole position, sobretudo pelo desempenho da Ferrari nos testes de inverno e pelo grande destaque que toda a mídia e os comentaristas davam ao F-2008. Para desespero de quem fez apostas levando em consideração as páginas do jornais, o brasileiro não fez nada melhor do que o 4º tempo. A pole ficava com a McLaren de Lewis Hamilton. Em 2º, uma grande surpresa: Robert Kubica, da BMW, ficara a apenas 0,155s do inglês. Era a demonstração de força da equipe que se mostraria desafiante em 2008.

Kovalainen em 3º e Heidfeld em 5º suscitavam expectativas de que a corrida fosse particularmente disputada entre McLaren e BMW, com a Ferrari de Massa correndo por fora. Mas o domingo australiano faria da abertura da Temporada 2008 uma das mais confusas e divertidas do passado recente.

Logo na primeira volta vários toques fizeram com que 5 carros abandonassem a prova. O toque mais relevante, no entanto, não era o mais grave do ponto de vista do impacto, mas sim da importância de quem se acidentou: Felipe Massa rodou infantilmente na saída da curva 1, batendo de leve na proteção de pneus e vendo todo o pelotão passar por si. Era o começo do inferno-astral da Ferrari na corrida, e de Felipe no campeonato.


Difícil avaliar até em qual ponto a ausência do controle de tração foi a responsável por incidentes como os de Massa e os outros que se viram durante a corrida. É preciso levar em conta que a geração atual é marcada pela divertida rotina de afobamento misturada a falhas um tanto quanto pitorescas, sem falar nas características particulares do circuito de Albert Park, um misto de parque com ruas da própria cidade de Melbourne, onde o asfalto geralmente fica repleto de detritos que dificultam a pilotagem fora do “trilho.” Além disso tudo, o muro está sempre a uma distância relativamente próxima.

A verdade é que pelas as circunstâncias da corrida, a primeira da F-1 sem o controle de tração em anos, tudo foi interpretado como festa e louvou-se o banimento do CT como o motivo das seqüências de quebras e batidas. A comemoração em torno da saída do dispositivo não era totalmente injustificada, porém, era exagerada. As corridas subseqüentes, como o chatíssimo GP Malásia provariam que apenas a ausência de um aparelho eletrônico era muito pouco para fazer da F-1 o show que os organizadores desejavam (e ainda desejam).

A corrida seguiu, com os dois ferraristas a vir do final do pelotão, tentando desesperadamente avançar. E em suas tentativas de ultrapassagem, Raikkonen e Massa não hesitaram em exagerar e levar suas disputas às últimas conseqüências. Resultados: duas saídas de pistas para Raikkonen; um enrosco de Massa com Coulthard que resultou em fim de corrida para o escocês, com a suspensão quebrada. A manobra discutível de Massa, que tentou dividir a curva mesmo estando com mais de meio carro atrás da RBR, gerou palavras duras da parte de David: “eu olho para frente, não para trás. Ele tinha melhor visão do que iria acontecer. Ele está disputando o mundial, eu não.”
Para completar o fim de semana de pesadelo de Massa, seu F-2008 não completou a prova, confirmando o péssimo início de ano do brasileiro.

Voltas depois, um susto: a Toyota do estreante Timo Glock saiu da pista, atingiu um desnível na grama e levantou vôo como um avião. O carro voltou a pista semi-destruído, provocando imagens plasticamente bonitas para quem gosta de batidas. Glock saiu do que restou de sua Toyota ileso.


Enquanto isso, Lewis Hamilton seguiu intocável, a despeito das seguidas entradas do Safety Car. Correu sozinho, como se não existissem adversários.

Quase no final da corrida, o impensável acontece com a Ferrari: a favoritíssima equipe vê Kimi Raikkonen abandonar a prova a 6 voltas do fim, porém, classificado em 8ª, devido às várias quebras que reduziram o número de carros a chegar ao final a apenas 7.De toda forma, foi um duro golpe no cavalinho rampante. Dois motores quebrados na primeira corrida do ano, prévia do campeonato complicado que seria vivido pelo tiffosi.

A grande surpresa do final da corrida era a presença de Rubens Barrichello entre os pontuáveis. Beneficiado com a hecatombe que dizimou mais da metade dos carros ao longo da corrida, o brasileiro caminhava para um pódio. No entanto, a entrada nos boxes com as luzes vermelhas acionadas levou o brasileiro a ser desclassificado após o fim da corrida.

Ao final das 58 voltas, Lewis Hamilton venceu com autoridade, seguido por Heidfeld e Rosberg (este último dando a falsa impressão de um bom ano para a Williams), num pódio incomum. Seria, na verdade, uma dobradinha da McLaren, não fosse a azarada entrada do Safety Car justamente às vésperas do reabastecimento de Kovalainen, que foi obrigado a esperar o pit lane se abrir. Mesmo assim, chocolate de Ron Dennis: a McLaren foi a única equipe a terminar a corrida com os dois carros intactos.
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Pequeno resumo da corrida:


O Ano da Confusão

Num outro dia eu chamava atenção para a possibilidade de vivermos em 2009 um dos campeonatos mais confusos da história, com contestações, e decisões de prova saindo no tapetão. Não imaginava, porém, que o salseiro se iniciasse antes de o primeiro ronco de motor ser ouvido em Melbourne.

Os difusores (peça localizada no fundo da parte traseira do carro, com o objetivo de “limpar” o ar e proporcionar maior estabilidade) da Brawn, Williams e Toyota, que levantaram suspeitas das outras equipes, foram considerados legais pelos comissários. Ferrari, Renault e Red Bull, autoras do pedido de investigação, já avisaram que irão recorrer da decisão na Corte de Apelações da FIA por considerarem a peça irregular nos carros das equipes primeiramente citadas. O imbróglio: a reunião da corte só será possível depois do GP Malásia, em abril. Ou seja, duas corridas podem ficar com o resultado em suspenso, dependendo de uma decisão que não será resolvida na pista.

É um péssimo começo para uma temporada que gerou muita expectativa positiva.

quarta-feira, 25 de março de 2009

Pré-2009: O que vem do meio, te atinge?

Num ano que começaria já sob ambiente confuso, com ecos da crise financeira a assolar as montadoras e causarem a saída de uma delas, as novas regras instituídas à F-1 apenas ajudariam as equipes médias a sonhar com a possibilidade de evoluir e chegar mais perto das grandes. Foi com esse intuito que o regulamento técnico foi alterado: para democratizar a vitória e tirá-la da panelinha Ferrari-McLaren. A grande pergunta que se faz a poucos dias da abertura do mundial é: será que vai funcionar?

O leitor já deve estar sabendo: a crise exige que as equipes diminuam os gastos para que a categoria continue viável. Além disso, a influência da aerodinâmica nos carros, alma da F-1 moderna, foi reduzida, teoricamente com o objetivo de facilitar a aproximação e, por extensão, as ultrapassagens. O ambiente de mudanças produziu carros esquisitos e uma tremenda incerteza quanto à efetividade das medidas, que ainda só começaram a ser implantadas. Para os próximos anos são esperadas padronizações de várias partes do carro, além da adoção de um limite de gastos que torne a F-1 atrativa a um maior número de interessados. É, talvez, o fim da era de orçamentos com três dígitos na casa do milhões.

Antes de falar nas tais equipes médias, um esclarecimento: a Toyota, por exemplo, pode ser considerada uma equipe média? Uma equipe que gastou, estima-se, mais de 400 milhões de euros em 2008? Sim, para efeitos práticos, sim. O termo “média” será usado aqui para designar equipes que ficam no meio do grid. Será uma atribuição “geométrica” e não financeira.
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A expectativa em torno dessas equipes ditas médias aumentou muito com a nova F-1 que estréia no próximo fim de semana. Entre as médias, muito se espera da BMW, a equipe que incomodou as grandes na primeira metade do ano passado, liderando os mundiais, tanto de construtores como de equipes. BMW que, aliás, cumpriu todas as metas de seu plano de desenvolvimento na F-1. Em 2007 a equipe esperava brigar por pódios, conseguiu. Em 2008 os bávaros ambicionavam as primeiras poles e vitórias e conseguiram. Em 2009 o alvo do time é brigar pelo caneco. A continuar com a rigorosidade monástica de trabalho quem põe em dúvida a capacidade dos alemães?

Considerando ainda a dupla de pilotos com a qual Mário Theissen, o chefe de equipe, trabalha, é impossível não criar esperanças de bons resultados para a BMW. Robert Kubica e Nick Heidfeld formam uma dupla que, no conjunto da obra, só fica devendo à Ferrari, em nível badalação que envolve os dois nomes. Kubica por ser um dos novatos-gênios que chegaram à F-1 nos últimos anos, demonstrando talento suficiente para já ser apontado como um dos melhores do grid. Heidfeld pela experiência de mais de 150 largadas e pelo talento que, se ainda não se converteu em vitórias, é inegavelmente presente no estilo de pilotagem do alemão.

Juntando o bom trabalho desenvolvido pela BMW à qualidade de sua dupla de pilotos, cresce a expectativa em torno das reais capacidades do time bávaro.
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As outras equipes consideradas médias vêm de um grande equilíbrio. Em 2008 Renault, Toyota, Red Bull, Williams e Toro Rosso brigaram ferozmente pelos lugares intermediários e pelo direito de ir ao Q3, sessão final de classificação em que só são admitidos os 10 mais rápidos. Para todas essas equipes, há expectativa de crescimento e de maior acirramento na disputa. Mas no quesito “piloto”, duas podem desequilibrar.

Fernando Alonso da Renault e Sebastian Vettel na Red Bull são sinônimos de interesse e curiosidade da parte do público. Foram duas das surpresas de 2008, por motivos obviamente diferentes: Alonso por conseguir extrair leite de pedra e vencer duas corridas com o fraco R28, provando suas capacidades e seu oportunismo a quem ainda tivesse dúvidas. Vettel pela boa temporada e pela constante presença nos pontos, sem falar nas impressionantes pole e vitória com chuva em Monza. Ambos ganharam credenciais de showman no ano passado e, sem a obrigação de vencer (afinal, estão em times médios), são candidatos a continuar surpreendendo.
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A Toyota chegou a impressionar nos testes de inverno. O TF109, modelo da equipe para a temporada, chegou a liderar algumas sessões de testes, mas ainda não mostrou confiabilidade suficiente para ser apontada como favorita. A Williams mantém-se sob as nuvens, e a capacidade de seu FW31 ainda desperta dúvidas. Na Toro Rosso o maior destaque é a semelhança do STR4 com o RB5 da co-irmã RBR. Nada mais.

Resta, enfim, a maior surpresa da pré-temporada: a Brawn GP. O time que chegou abalando as estruturas e liderando sistematicamente os treinos vai a Melbourne na condição de favorito. A continuar andando segundos a frente das rivais, a BGP é mesmo favorita, mas não ao GP Austrália e sim ao mundial. Mas é cedo para elevar a BGP a tão alto patamar. Uma equipe surgida de uma grande incerteza numa época de incertezas precisa ser avaliada com cuidado durante a temporada.

Não restam dúvidas, porém, de que o que vem de baixo pode sim atingir as grandes. E é esse o desejo do planeta-motor.

Adjetivando Ecclestone

Explica-se assim o mais novo caso que ilustra o senso de justiça torto que rege a mente dos homens que administram a F-1: a Brawn não aceitou a ajuda financeira de Bernie Ecclestone, que desejava se intrometer na FOTA. Em retaliação, Ecclestone considerou a BGP uma equipe totalmente nova e que, de acordo com o regimento da categoria, não receberá de imediato os dividendos relativos ao direito de imagem.

Em miúdos: a situação da BGP começa a inspirar cuidados. A equipe não tem patrocinadores e agora sabe-se que também não receberá os direitos da FOM.

Enquanto isso, Bernie Ecclestone vai provando aos poucos que apesar da senilidade ainda é um garotinho: quer comandar um negócio super-profissional com estratégias infantis. Para o chefão o jogo só vale se for jogado do jeito dele.

É assim que os chefões da F-1 querem incentivar novos empresários a criar equipes: tendo zero de bom senso e respeito a acordos.

Incoerente, infantil, irritante e, no mínimo, leviano. São os adjetivos usados com freqüência para ilustrar o grau de comprometimento de Ecclestone e CIA com o esporte que eles têm nas mãos.

terça-feira, 24 de março de 2009

Pré-2009: As Grandes Damas

Conceitos e rivalidades são próprios do esporte, especialmente os de massa, que possuem longo alcance no mundo inteiro. A idéia que o pensamento coletivo forma sobre determinada agremiação ou desportista e a rivalidade criada através dos anos pelas disputas históricas são das coisas mais saborosas para se apreciar numa competição. Na F-1, conceitos sobre pilotos são altamente mutáveis. Tanto que diz-se que “um cara é tão bom quanto sua performance na última corrida.” Já entre as equipes, as rivalidades atravessam décadas, e quem é considerada “grande” precisa de um tempo para deixar de figurar entre as favoritas.

O histórico da F-1 construiu e demoliu ícones através das décadas, pela própria dinâmica que a política da categoria adquiriu. Equipes subiram, conheceram a glória, mas não conseguiram fôlego para resistir. Lotus, Tyrrel, Brabham e tantas outras são lembranças do passado da F-1. No grid atual apenas Ferrari, Williams e McLaren ostentam um histórico que lhes possibilite o rótulo de “equipes tradicionais”, apesar de a Williams há muito tempo não figurar entre as equipes favoritas.

As duas grandes damas, no final das contas, são Ferrari e McLaren. São as duas únicas que atravessaram décadas e enfrentaram períodos de jejum consideráveis, mas se mantiveram firmes a ponto de ainda serem competitivas. Não é por coincidência que exista entre esses dois times a maior rivalidade da F-1 atual. Eles lideram a maioria das estatísticas dos times e protagonizaram, nos últimos dois anos, disputas interessantíssimas pelo título. O acirramento da rivalidade ocorreu em 2007, com o célebre caso de espionagem pelo qual a McLaren foi considerada culpada. Depois disso, no entanto, a rivalidade entre os dois times parece ter encontrado uma fase mais madura.

Nesses dois anos, as duas equipes se confirmaram como as dominadoras, mesmo com o eventual avanço de uma BMW ou uma Renault correndo por fora. A prova da força psicológica de McLaren e Ferrari é tal que, mesmo não sendo as mais rápidas nos testes, as equipes titãs não são desconsideradas, o que é uma verdadeira surpresa, sobretudo, no caso da McLaren, que realmente andou mal nos testes de inverno. Seus pilotos também se mostraram mais fortes e amadurecidos a cada ano, exceto, logicamente, no caso de Heikki Kovalainen. Depois de serem as atrizes principais de dois campeonatos divertidos e levemente atrapalhados, Ferrari e McLaren terão em 2009 o ano das conclusões sobre o real valor de cada uma.

Quando se fala em Ferrari, há consenso: a equipe italiana possui a dupla mais forte do grid. Os dois pilotos de Maranello protagonizaram, cada um, uma disputa de título nos últimos dois mundiais. Apenas Kimi Raikkonen sagrou-se campeão. Desvantagem para Felipe Massa? Nem sempre. Há derrotas que seguramente podem ser mais redentoras do que êxitos e é essa noção de pesos e medidas diferentes que deixa Felipe em patamar de igualdade perante Kimi. Se Raikkonen tem a seu favor um título, Massa apresenta a imagem de um piloto dedicado, comprometido com a equipe, ciente do espírito coletivo que tanto agrada aos italianos. O maior veículo de propaganda de Massa como homem de equipe é seu próprio currículo: abriu mão da vitória em Interlagos em 2007 pensando no time, e tornou-se, portanto, fundamental na conquista de Raikkonen; ressurgiu das cinzas em 2008, depois de sofrer com a pressão pelos abandonos nas duas primeiras provas e mostrou força mental suficiente para passar de zebra a favorito. A guinada de Massa lhe proporcionou uma incrível ascensão na bolsa de apostas da F-1. Seu nome hoje é tão cotado quanto o de Lewis Hamilton, o atual campeão, e boa parte do reconhecimento de Felipe se deve à sua postura em 2008, ocasião em que o brasileiro não desistiu de acreditar no título em nenhum momento, mesmo contra todas as possibilidades.

O nome de Massa não é mais questionado dentro de Maranello e goza de um status extremamente alto no interior da fábrica das rossas.

Já Kimi Raikkonen terá seu ano decisivo. 2009 é o ano do vestibular do finlandês e, nessa prova, não parece haver suplência. Raikkonen já queimou suas balls com o fraco desempenho em 2008. Poucas vezes viu-se um campeão em exercício tão apático. Kimi já admitiu o apagão e parece se esforçar para melhorar seu desempenho. Parou de beber e perdeu peso, dando sinais de maior comprometimento com o trabalho. Mas isso é pouco para um piloto da Ferrari.

Por carregar consigo a identidade de um país, a equipe italiana é seguida como uma religião entre os habitantes da península itálica. Há pressão por todos os lados. Implacável e sufocante pressão movida pela torcida e alimentada pela imprensa, sempre disposta a se precipitar e cobrar mais empenho dos pilotos ao menor sinal de desinteresse. Nesse ponto a personalidade de Raikkonen já é uma bola fora. O nórdico já declarou não ter paciência para as obrigações comerciais, que no caso da Ferrari, equipe mais visada do grid, são rotineiras. Raikkonen é calado e não gosta de entrevistas. Curte badalação, mas não a do tapete vermelho, reservada às grandes estrelas, e sim a das boates regadas a bebedeiras e loiras vertiginosas. Seu comportamento é, muitas vezes, visto pelo expansivo torcedor italiano como negligente e desinteressado. Pilotos assim não costumam durar na mais rubra das equipes, mas a permanência de Raikkonen e a renovação de seu contrato até 2010 indicam que a cúpula da Ferrari confia no talento de Kimi, mesmo tendo a nítida noção de que o campeão de 2007 é um piloto que flutua rapidamente entre bons e maus momentos.

Enquanto equipe, a Ferrari também tem muito o que provar em 2009. É consensual a idéia de que quem derrotou Felipe Massa no ano passado não foi apenas Hamilton, mas também, e em grande proporção, a equipe do brasileiro. Erros motivados pela falta de liderança conseguiram fazer com que a equipe perdesse toda a vantagem que o F-2008 apresentou no início do ano. A Ferrari tinha o melhor carro do grid, mas sucumbiu à própria desorganização. Os italianos precisam provar que conseguem manter o mesmo nível de profissionalismo e confiabilidade dos anos Schumacher, mesmo sem o alemão por perto.

A McLaren começa o ano com o piloto campeão. Lewis Hamilton finalmente chegou lá, apesar de não feito em 2008 um ano tão bom quanto em 2007. Lewis se mostrou tão atrapalhado como em sua temporada de estréia, apesar do enorme e indiscutível talento. O inglês ainda precisa de polimento, especialmente na hora de disputar posições. Nessas horas fica explícito o afobamento do campeão e as manobras decididas no calor da emoção acabam descambando para as odiosas punições (nesses casos, em particular, há também de se lembrar da atual tendência de assepsia que rege a mente do comissários de pista e os leva a punir com rigor excessivo). Hamilton também sofre com a célebre falta de estrutura e de força mental que ficaram conhecidas no final da temporada 2007.

No entanto seu nome não encontra barreiras dentro da McLaren. Apadrinhado pelo chefão Ron Dennis, Hamilton é prioridade total na equipe de Woking. O inglês que já provou ser bom em acelerar as baratas motorizadas, parece ter uma atividade extra em 2009: desenvolver um carro que dá sinais de não ter nascido no melhor berço. O MP4/24 que a McLaren usará em 2009 causou má impressão na pré-temporada, apresentando problemas e relegando a equipe aos últimos lugares na lista de tempos. É a hora de ver se o menino Lewis evoluiu a ponto de ser considerado um piloto com razoável conhecimento técnico para melhorar um modelo durante o ano.

Mesmo não começando o ano como favorita, como até já foi admitido por Nobert Haug, integrante ao alto escalão do time, a McLaren jamais pode ser desconsiderada. O know-how da equipe é relevante graças à experiência de seu corpo técnico. É time para crescer durante a temporada, especialmente depois do que foi apresentado em 2008: a McLaren esteve impecável, oferecendo, quase sempre, estratégias e trabalhos de boxes infalíveis a seus pilotos. Enquanto equipe, parece ser a melhor do paddock. É a hora de confirmar de vez a qualidade e a capacidade de reação de seu elenco.

E a equipe de Woking ainda conta com uma tremenda vantagem perante a maior rival: a dupla de pilotos da McLaren é claramente díspar. Hamilton, além de ser melhor piloto do que Kovalainen, não sofre com um companheiro birrento e/ou carente de atenção. Kovalainen parece saber muito bem o seu lugar e o seu papel em Woking. É, talvez a maior vantagem da equipe. Enquanto Massa e Raikkonen dividem as atenções e travam uma espécie de guerra fria pela preferência da equipe, Hamilton já começa o ano com as atenções voltadas para si. É o sonho de todo piloto.

As grandes damas vão começar a duelar. Alguém arrisca uma aposta?

segunda-feira, 23 de março de 2009

Pré-2009: Continuamos de Olho

Chega de pré-temporada, chega de especulações, chega de DPT (a famosa Depressão Pós-Temporada de F-1). Agora é a hora de o tesão aumentar, porque, finalmente, está para começar a nova temporada da categoria a qual todos prestamos reverência (apesar de termos vontade de protestar quando os donos do circo dão algumas trombadas). A Fórmula-1 2009 vai começar.

A madrugada do próximo domingo será o apogeu do momento mais esperado do ano para muita gente. O GP Austrália será o pontapé inicial de uma temporada que promete ser muitíssimo equilibrada e que pode nos apresentar surpresas. Os testes de inverno não apontaram uma equipe que ocupe o posto de franca favorita. Dos treinos do gelado inverno europeu ficou a impressão de que a briga pela ponta será uma tremenda incógnita.

A falta de uma equipe que reine soberana nos palpites para Melbourne pode ser explicada, entre outros motivos, pelas radicais mudanças implantadas para 2009. A F-1 finalmente se preocupou consigo mesma, e os carros que vão estrear na Austrália vão causar estranhamento a quem não acompanhou a pré-temporada com atenção: asa dianteira enorme e com ângulo ajustável de dentro do cockpit, carenagem sem apêndices aerodinâmicos e asa traseira minúscula. Esse é o trio principal das mudanças que a F-1 registrou, com o objetivo de limitar o arrasto aerodinâmico e facilitar a aproximação dos carros e, consequentemente, as ultrapassagens. Há também a maior dor de cabeça das equipes, o KERS (sistema de recuperação de energia cinética), dispositivo que irá recuperar parte da energia desprendida nas frenagens e converter em potência extra para os bólidos. Desconsiderando a dúvida sobre a real eficiência das medidas, já se pode dizer, pelo menos, que a categoria perdeu o medo da mudança e jogou fora (em parte e relativamente) o conservadorismo.

Na geopolítica do grid, muitos conceitos subiram: Lewis Hamilton finalmente é campeão. Fernando Alonso justificou o valor de seu passe demonstrando oportunismo. Rubens Barrichello deu xeque-mate em quem queria aposentá-lo. Robert Kubica e Sebastian Vettel tornaram-se verdadeiras estrelas depois de suas respectivas vitórias. Sobre todos, Felipe Massa foi o que apresentou maior crescimento. Foi o piloto que mais venceu, anulou o companheiro de equipe campeão (uma virada cheia de significados dentro de Maranello), demonstrou grande força mental e terminou o ano deixando a impressão de que era o campeão sem a coroa. Começa 2009 como favorito, aguardando a real posição da Ferrari entre as equipes.

Entre os times, por sinal, pairam as maiores dúvidas. Os testes de inverno, ora com chuva, ora com tempestades de areia, não revelaram uma potência soberana. O que se tem são apenas noções: noções de que Ferrari e Toyota parecem estar bem, junto com a BMW. Noções de que a Renault e a McLaren terão de trabalhar para figurar entre as favoritas. E noção de que a Brawn começa o ano forte. No pouco tempo de existência, a equipe causou ótimas impressões, mas o curto tempo de vida impede a formação de qualquer conclusão. Porem, mesmo que não venha para brigar diretamente por vitórias, a BGP deixa a impressão de que, pelo menos, vai embolar a disputa no meio do pelotão.

Na geopolítica de fora das pistas, continua a disputa pelo poder e as medidas decididas no grito. A criação da FOTA (Associação das Equipes de F-1), sigla que congrega todas as 10 agremiações que compõem o campeonato, acirrou a briga para decidir que, afinal, manda na F-1. A FIA de Max Mosley, habituada a regular a categoria de forma unilateral, ainda se adapta ao novo inimigo surgido no front. Bernie Ecclestone também já demonstrou alguma antipatia em relação a entidade que reúne os times, especialmente depois de as equipes pedirem uma revisão na divisão dos lucros. Os dois velhotes já tentaram causar algum desentendimento no interior de FOTA, e a recente confusão envolvendo o sistema de pontuação foi um exemplo. Ecclestone, aliás, tentou ingressar na associação comprando parte do espólio da Honda. Uma sorte que a transação não foi levada adiante pelos japoneses.
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Quanto ao blog e ao blogueiro que comanda as ações por aqui, muita expectativa. Essa será (espero eu) a 1ª temporada completa do De Olho na F-1. Os meses até aqui serviram para que o Olho-Chefe afinasse a sintonia, conhecesse gente nova e melhorasse pouco a pouco esta casa. Se ainda está longe de ser ótimo, esse blog, pelo menos, é retrato fiel da trajetória de um cara que tem um sonho. É aqui, com todos os erros e acertos de quem ainda tem muito o que aprender, que se desenha uma história que tem o desejo de ser longa. É com prazer que o De Olho segue em 2009, combinando a paixão de um jovem pelo esporte que combina engenho mecânico e capacidade humana com um estilo de escrita um pouco rude e ainda em desenvolvimento.

Continuamos de olho na Fórmula-1, como diz o título do blog, cientes de que a liberdade para experimentar se tornou, enfim, o principal trunfo do blogueiro dessa página. Estão todos convidados a me acompanhar, com a única condição de embarcar junto comigo na vontade de não pertencer a um estilo único, mas sim de transitar entre vários deles.

Vamos? Já vai começar!

sexta-feira, 20 de março de 2009

Pé no Breque!

Pela superlatividade da reação que ganhou o mundo nos últimos dias, a FIA voltou atrás. Pelo menos em 2009, as regras da pontuação continuam privilegiando a regularidade. A federação pisou no breque e cancelou, ao menos temporariamente, a idéia estapafúrdia de dar o título simplesmente ao piloto que mais vencer.

Há pouco a dizer porque, além da ampla divulgação midiática que a notícia rendeu, os significados são bastante explícitos: diante das negativas da parte de pilotos, equipes, imprensa e torcida, a FIA não pôde levar sua idéia a diante.

A FOTA, associação das equipes, pressionou a federação emitindo um documento em que afirmava que a decisão da FIA contrariava o Código Desportivo Internacional e era, portanto, ilegal. O gesto da entidade que representa as equipes demonstra, acima de tudo, que a FIA sentiu, finalmente, que há uma força política soberana do outro lado do jogo: as equipes, a força motriz do campeonato de automobilismo que carrega a fama de ser o mais importante do planeta.

Mas o assanhamento de Max Mosley e Bernie Ecclestone promete ser, paralelamente ao campeonato que começa daqui a poucos dias, a discussão do ano. Os dois velhinhos parecem não ter desistido de importunar a FOTA.

E mais: a ferida aberta entre FIA e FOTA pode, obviamente, causar alguns distúrbios durante a temporada. Porque se uma coisa ficou clara com essa lenga-lenga toda, é que Ecclestone e Mosley querem implodir a entidade que reúne as equipes.

Os velhotes ingleses são, além de incoerentes em suas gestões, autoritários ao extremo.

Contestações não são muito toleradas no mundinho dos dois anciãos que comandam a F-1.

quinta-feira, 19 de março de 2009

Passaram em Branco

Só para anotar, duas notinhas passaram em branco nos últimos dias:

- Jean Todt desligou-se definitivamente da Ferrari. Presente na equipe de Maranello desde 1993, o francês foi um dos responsáveis pela reestruturação da equipe nos anos 90/2000. Como diretor-esportivo da escuderia italiana, Todt elevou o nível de profissionalismo da equipe rossa, profissionalismo que culminaria na acachapante rotina de títulos da equipe na última década.

De 1993 a 2007 Todt ocupou a cadeira da direção-esportiva da Ferrari. Desde então dedicou-se a expedientes internos dentro da empresa. No início dessa semana, afastou-se definitivamente da fábrica italiana, encerrando uma das passagens mais brilhantes e memoráveis da equipe.

De Olho no Videokê: Deixe a Menina, Ecclestone

- Na semana passada foi divulgada a separação formal entre Bernie Ecclestone e Slavica, a croata com traços de modelo com a qual o dirigente da F-1 foi casado durante 24 anos.

Do casamento entre Bernie e Slavica restam duas filhas. O divórcio deve ser conhecido como a mãe de todas de divisões de bens, tendo em vista a colossal fortuna de Ecclestone. Slavica foi a autora do pedido, alegando que o comportamento de Bernie era excessivamente peculiar e impedia a boa convivência entre os dois enquanto cônjuges.

Entendam “comportamento excessivamente peculiar” da forma que quiserem. A mim, parece apenas uma coisa: uma mulher deste tamanho é grande demais para ser guardada a sete chaves. Slavica, possivelmente, quer outros horizontes e um casamento com um homem da estatura (e da idade) de Ecclestone certamente não lhe proporciona essa nova “visão”, se é que me entendem. Afinal, um senhor nessa altura da vida já não deve proporcionar a Slavica a slavicada que ela merece e deseja.

Uma dica para o tio Bernie: deixe a menina, caro senhor.




"deixe a morena contente, deixe a menina sambar em paz..."

quarta-feira, 18 de março de 2009

De Olho no Videokê: Ecos de Paris e o Vacilão

No dia 5 de março, há 12 dias, a FOTA se reunia em Genebra para discutir pontos importantes e aparar arestas entre seus membros. Da reunião saíram diversas propostas econômicas e esportivas com as quais as equipes pretendiam melhorar a categoria a qual pertencem. À época este blogueiro cravou que “notável é o efeito que essa paz declarada entre as equipes causa no outro lado da batalha. A FIA inquisitora que sempre fez o que quis sem dar satisfações agora possui um contraponto à altura. A federação que nunca se contentou apenas em regular a categoria mas sempre fez questão de governá-la com mãos de ferro será obrigada a repensar parte de suas ações. Equipes coesas significam menos espaço para a atuação imperial da entidade presidida por Max Mosley.”

Eu não poderia estar mais enganado.

Pouco menos de 15 dias depois da reunião da FOTA que, entre outras coisas, apresentou uma proposta cabível para o sistema de pontuação, a FIA mais uma vez prova que gosta de mandar e que não se importa com o rebuliço que isso vá causar. Na verdade, enquanto a entidade máxima do automobilismo estiver sendo comandada por um senhor que gosta de causar polêmica porque “a F-1 vive disso”, vamos ter que nos acostumar com as pirotecnias.

A repercussão da decisão tomada pela FIA em Paris foi apedrejada por todos os lados, mas a federação mantém-se impávida em sua posição. Tudo porque, na verdade, Max Mosley está cagando para as equipes e, digo até, para a torcida. O que ele quer é que a F-1 apareça, tenha mídia, saia na capa dos jornais. Mosley é o rei da esculhambação. É uma espécie de Chacrinha, mas que fala inglês e ao invés de perguntar "quem quer bacalhau?" oferece bananas à sua platéia.

É, enfim, um atrapalhado que não tem um plano de vôo sério para a entidade e para a categoria máxima. Um borra-botas, vovô babão que se diverte em puladas de cerca com mocinhas sapecas e é incompetente o suficiente para se deixar flagrar. Um típico e incorrigível Vacilão, como cantaria Zeca Pagodinho.



Mosley "deu lavagem ao macaco, banana pro porco, osso pro gato" e, na confusão que armou, fez de sua própria incoerência o signo máximo do tipo de gerente ao qual a F-1 esteve subordinada nos últimos anos.

terça-feira, 17 de março de 2009

Saudade de 15 Anos

Muita gente espera por um campeonato de F-1 equilibrado em 2009. Sou um deles, claro. Porém, mais do que um campeonato equilibrado, imagino que estamos também diante de um campeonato potencialmente confuso.

O ano de 2009 vai reunir em seu balaio a crise financeira (que obrigou as equipes mais gastadeiras a pisar no breque com a grana), as mudanças radicais nas configurações dos carros (KERS e toda a polêmica em torno de sua utilidade inclusos; pneus slicks) e agora uma mudança radical no sistema de pontuação: a partir de agora o campeão será o piloto com mais vitórias durante o ano e os pontos apenas funcionarão como critério de desempate. É uma das definições da reunião do Conselho Mundial da FIA, ocorrida hoje em Paris.

Sim, a FIA ousou. A vitória desse modelo de classificação é, sob um dos prismas, a vitória política de Bernie Ecclestone, o homem do dinheiro na F-1. O gerente da área comercial da categoria já havia proposto um sistema “olímpico”, em que a pontuação como conhecemos hoje seria ignorada para dar lugar a um quadro de medalhas. O piloto com mais vitórias seria o campeão e ponto. A sugestão de Ecclestone não foi recebida com muito entusiasmo, mas a FIA agora aprova um sistema muito parecido.

A reunião de hoje no Conselho Mundial é uma sonora derrota para a FOTA, a associação que representa as equipes. A partir de agora os integrantes da liga dos times devem começar a perceber que apenas se juntar sob uma bandeira e discutir a F-1 em conjunto não resolve se não houver real representatividade política dentro da FIA. A sugestão de alterar o quadro da classificação para o sistema 12-9-7-5-4-3-2-1 que foi apresentada pela entidade dos construtores foi rejeitada.

Mas o que há por trás da decisão do conselho? A tentativa desesperada de mostrar serviço, de aparentar estar trabalhando para aumentar o show.

O campeonato que começa no próximo dia 29 começa a se parecer muito com o de 1994, em que pesem as proporções de superlatividade de tudo o que aconteceu há 15 anos. Lá, a FIA também resolveu mudar as regras do jogo, por dois motivos, um deles sendo causa do outro: a superioridade Williams era astronômica e, por conseqüência, gerou um grande chororô da parte das equipes que não conseguiam acompanhar a evolução tecnológica do time de Grove. A chave da discórdia era a tal suspensão ativa, que possibilitava aos pilotos de sir Frank a permanente sensação de que o carro planava sob um tapete liso, mesmo nas pistas mais onduladas. A FIA então resolveu banir o dispositivo para tentar devolver a igualdade de condições à competição e ninguém pode dizer que a federação não conseguiu. No final do ano o campeão não era do time de Frank Williams, tampouco a equipe era a de Frank. Uma pena que para atingir o objetivo desejado, a temporada de 1994 tenha sido uma das que apresentou o maior número de distúrbios do race control, sem falar nos acontecimentos de Ímola e da Austrália.

Em 94 o desejo era o de dar show. A FIA se incomodava com a posição da Williams, anos-luz a frente do restante das equipes. A gigante Ferrari se mostrava claramente insatisfeita por não conseguir acompanhar as equipes de ponta. Uma pena que o maior show daquela temporada não foi realizado na pista, mas sim em pirotecnias da federação que quis decidir um título com o apito na mão.

Agora é só transpor a situação para 2009: a federação continua querendo dar show, mesmo que a situação de superioridade das equipes de ponta seja mais amena do que a de 15 anos atrás. Para tentar atingir seus objetivos fez uma mudança radical nas especificações do carro, todas elas com eficiência duvidosa até aqui. Agora a FIA anuncia essa tremenda mudança na tabela de classificação, rompendo com um precedente histórico que sempre marcou a F-1: o campeão nunca é apenas o cara que vence corridas memoráveis, mas também aquele que é racional o suficiente para se contentar com um pódio, em determinadas situações.

É a maior mudança de mentalidade em muitos anos na F-1. Com a vitória sendo praticamente a única situação de validação do título, será curioso ver o que figuras afobadas como Lewis Hamilton e, sobretudo, Felipe Massa farão num ano em a disputa será na base do tudo ou nada. Mas será temeroso perceber que na atual filosofia de “não me toques” que rege a FIA, disputas de posição um pouco mais acaloradas poderão facilmente descambar para a chuva de punições, muitas vezes injustificadas, tal como em 1994. Fora a hipotética possibilidade de que as mudanças nas regras de projeção e construção dos carros gerem interpretações novas da parte dos projetistas. Se essas inovações (como, por exemplo, um ajuste do KERS que gere menos desgaste de pneus) forem percebidas por apenas uma ou outra equipe, as outras se sentirão no direito de reclamar. Se a FIA seguir o exemplo de 1994, quando a avalanche de reclamações transformou a entidade numa mina de punições e multas, 2009 pode repetir um dos anos mais tumultuados de toda a F-1.

A FIA ousou, enfim. Mas pode ter ousado para o lado errado.

segunda-feira, 16 de março de 2009

Rapidinha de Jerez: A Coqueluche

Ontem teve início mais uma semana de testes, dessa vez na tradicional pista de Jerez de La Fronteira, na Espanha. Dessa vez só quatro equipes trabalham (Brawn, McLaren, Renault e Williams). E adivinhem que equipe liderou com sobras outra vez?

Já pensaram na possibilidade de Jenson Button e Rubens Barrichello pintarem para o título (sempre há um bicudo que, nessas horas, me lembrará que a pré-temporada pode ser enganosa. Eu sei! O que faço aqui é um exercício imaginatório ao qual os jornais, as revistas e os sites recorrem com freqüência. Chama-se especulação) depois de serem dados como acabados?

É simplesmente por motivar dúvidas como essa, incabíveis há 3 semanas, por exemplo, que a Brawn é a coqueluche da pré-temporada, mesmo que o São Brawn que opera esse milagre seja de barro.

sexta-feira, 13 de março de 2009

Rubens Barrichello e um pedido

Na quarta-feira, no intervalo do cursinho, o professor Grijó me perguntou, inquisitor: “não vai falar sobre Rubens Barrichello?” O professor (“e escritor, ambos em atividade”, que você encontra na lista de links como o proprietário do blog Ipsis Litteris) queria a palavra de um “especialista” (?) sobre a volta por cima do piloto com mais largadas na história e que estava sob o risco de perder o emprego. É a primeira vez que escrevo atendendo a um pedido, e o post só se materializou, caro mestre, porque foi você quem pediu.

Antes de começar: nada contra o Tema da Vitória. Adoro ouví-lo, me trás lembranças deliciosas. Também não tenho problema algum com o sentimento de nacionalismo, pois o trago comigo. Só acho que ele precisa de moderação para não se tornar devoção cega.

Levemos então o assunto como numa mesa de boteco, ou na bancada da cantina. Porque falar muito a sério sobre Rubens Barrichello desperta paixões e reações imprevisíveis.

Barrichello é o mais experiente piloto da história. Fato, incorrigível, atestado pelas suas mais de 260 corridas. Do alto dessa superlativa estatística está um piloto respeitado pela F-1 e por todos os países por onde passa, mas que recebe uma indiferença dolorida em sua terra natal. O relativo insucesso de Barrichello na F-1 explica parte desse sentimento de rejeição que envolve o mais experiente dos pilotos: Rubinho conquistou apenas 13 poles e mirradas 9 vitórias em sua trajetória na F-1, mesmo passando 6 temporadas inteiras pilotando a Ferrari no melhor momento da escuderia em toda a história.

Mas isso não basta para tentar explicar o que falta a Rubinho para ser tratado dignamente como persona pública. Para falar de Barrichello é preciso mergulhar em várias histórias, sejam elas de psicologia de massas, do Brasil recente ou do próprio automobilismo brasileiro e mundial. É bom preparar o fôlego!

É preciso primeiro entender uma característica única do brasileiro: precisamos de um salvador da pátria. Precisamos de alguém que nos afaste da selva de pedra diária que vivemos a cada dia. Precisamos chorar diante de um televisor ao ouvir o tema da vitória. É a catarse que nos livra do sentimento antiquado de que somos um povo que não aconteceu e para atingirmos as poucas horas de alegria que uma vitória nos dá, recorremos ao esporte. O futebol e a F-1, por serem esportes mundiais, são as vitrines em que esperamos aparecer como campeões. No futebol somos genuínos gênios, quem duvida? Na F-1 fazemos o papel de desafiantes que vencem e convencem. Afinal, a gente dá um baile nos europeus no esporte deles, como tantas vezes Ayrton Senna fez com o francês Alain Prost.


Nessas horas, somos o maior país do mundo, Brasil-il-il! E nos livramos temporariamente do terceiro-mundismo indesejável que nos persegue. Podemos chorar porque vemos que há pessoas que podem vingar a decadência social, ética e econômica que nos rodeia. E continuamos a exigir que a safra de ídolos se renove em ritmo industrial, porque a dor é muita e precisamos continuar a chorar.

Foi assim quando começamos a desbravar o automobilismo e vimos Emerson Fittipaldi fazer história em 1972. O clima de ufanismo emergido no período militar nos fez acreditar que “ninguém segura esse país”. Dois anos antes vencíamos o mundial de futebol de forma consagradora, e a economia do milagre econômico ia de vento em popa. O título verde-e-amarelo de Fittipaldi foi apenas mais uma ótima notícia para a propaganda do regime militar.

Fittipaldi ainda venceu em 1974 e seus seguidos êxitos levaram o automobilismo nacional a, finalmente, ser “descoberto”. Nos anos 80 Nelson Piquet papou mais três títulos e nos mal-acostumamos a sermos campeões. Piquet, no entanto, nunca fez questão de vestir a carapuça do Brasil-il-il. Talvez por isso seja hoje um quase estranho entre os brasileiros que não acompanham F-1 de perto.

Aí, o fim dos anos 80 viu nascer um fenômeno esportivo e midiático sem precedentes na história, até então. Porque quando Pelé brilhou, a tv não era aparelho indispensável nas casas do Brasil. Mas quando a estrela de Ayrton Senna reluziu com força, as condições para que o semi-Deus surgisse eram das mais favoráveis.

Queríamos e precisávamos chorar. O recém-implantado regime democrático não se mostrou, no primeiro momento, capaz de sanar o caos econômico. A hiperinflação nos aterrorizava. O remarcador de preços era o vilão-mor do cidadão. Os olhos se enchiam d-água, mas onde buscaríamos uma desculpa para nossas lágrimas?

O futebol não nos dava tal condição. Depois do fiasco da geração de 1982 a seleção brasileira tornou-se um signo decadente, somente ressucitado em 1994, coincidentemente ou não, no ano em que Ayrton morreu. As lágrimas começavam a se avolumar nos olhos. Ayrton vencia o mundial de 1988.

Choramos copiosamente.

E continuamos a chorar nos anos seguintes. Poupanças congeladas? Ayrton é o antídoto. O presidente é um rato sob processo de impedimento? Tome tantantan. O tricampeão nos poupou do suicídio coletivo.


É claro que a vitória simplesmente pela vitória não é capaz de nos transportar para o terreno da histeria coletiva. O modo como Senna fazia suas conquistas acontecerem eram, de fato, emocionantes. A disputa feroz com Prost em 1988 e 1989 na McLaren é uma delas. Foi uma briga que Ayrton ganhou em uma e perdeu na outra vez, enquanto os dois dividiam o mesmo teto. A forma como Senna foi derrotado, aliás, deu ao brasileiro ares de justiceiro divino. Em 89 Senna foi vencido no tapetão, numa decisão unilateral do presidente da FIA, o francês Jean-Marie Balestre, desafeto de Ayrton, conterrâneo de Prost. Em 1990, Ayrton se vingou de forma cinematográfica: a batida premeditada em Prost, agora na Ferrari, na decisão do título no Japão foi instantaneamente subentendida como o ato desesperado de um vingador que ajustou suas contas com o destino.

Senna jogou para a torcida e não há, obrigatoriamente, demérito algum nisso. Talvez realmente houvesse a intenção de “fazer as pessoas mais felizes no Brasil”. Ayrton fazia questão de sacudir com orgulho a bandeira do Brasil e suas palavras nos agradavam porque ele falava o que queríamos ouvir. Foi se santificando aos poucos, unindo suas performances geniais a um discurso que causava comoção. A morte abrupta e trágica, aos 34 anos, fazendo aquilo que amava e que tanto nos emocionou foi o passaporte para o Olimpo, e produziu uma pergunta imediata: de onde vamos tirar outro ídolo para nos alegrar nas manhãs de domingo?

Agora, talvez não precisássemos mais chorar as mágoas do cenário político-econômico. Queríamos mesmo era puramente reviver o glorioso sentimento que Ayrton nos concedeu. Como conseguiríamos?

O sucessor não estava pronto. O mais preparado deles era o tal de Rubens Barrichello. Mas o novato não estava em condições. Era muitíssimo jovem, em início de carreira e ainda vagava por equipes fracas. Era preciso dizer ao torcedor que ele precisaria de paciência, que precisaria se acostumar a ver corridas sem esperar pelo tantantan ao final. E nós, teimosos, ofendidos por não conseguirmos chegar nem ao pódio, começamos a cobrar de um jovem garoto mais do que ele podia nos dar.

Mesmo sem jamais vê-lo em um carro de ponta, chamamos o menino de “pé-de-chinelo”. A pressão continuava a crescer e Barrichello, talvez também vítima da baixíssima auto-estima que sentimos enquanto povo, não fazia questão de se isentar das responsabilidades. No fundo, no fundo, o sinal que ele dava para a torcida era o de que ele queria o peso de ser o novo Senna, mesmo pilotando uma Jordan. A falta de hombridade e de senso prático para admitir a impossibilidade de reviver as glórias de Ayrton talvez tenha sido o pior pecado de Barrichello.

Mau piloto Rubinho nunca foi. A prova foi o interesse que ele despertou em 1999, quando seu bom desempenho lhe valeu o convite das duas equipes mais poderosas da F-1 à época: McLaren a Ferrari ofereceram trabalho a Rubens. O brasileiro assinou com os italianos e estava armada a condição ideal para novo frisson no Brasil-il-il.


“Agora vai”, nos fizeram pensar. E Barrichello não fez questão alguma de desmentir o coro global. Não está se dizendo aqui que a mídia ou a Globo ou Galvão Bueno são os responsáveis pela indiferença que nutrimos por Rubinho. Diz-se apenas que o tititi de quem precisa vender um produto gerou uma expectativa que não seria correspondida, por uma série de motivos, o principal deles atendendo pelo nome de Michael Schumacher.

O alemão chegara à equipe de Maranello 4 anos antes, contratado a peso de ouro para reorganizar o caos que imperava na fábrica italiana. Depois da morte de Enzo Ferrari, no final dos ano 80, o time vermelho mergulhou num caos homérico, motivado pela disputa de poder interno na empresa. O cavalinho rampante já havia passado décadas sem vencer um mundial e, a continuar naquele ritmo, iria dividir uma cova com seu fundador.

Bicampeão pela Benetton, Michael Schumacher arriscou uma carreira de sucesso indo para uma equipe que não era mais do que média em 1996, apesar de toda a história que ostentava. Sua missão era recolocar a Ferrari no hall das campeãs e para isso, Schumacher comeu poeira por 3 temporadas, fazendo um lento e gradual processo de reestruturação na equipe rossa. O poder do alemão e a confiança que os italianos depositavam nele era tal, que Schumi chegou a decidir a demissão e admissão de engenheiros e projetistas.

Schumacher resistia à pressão indomável da imprensa italiana, ansiosa por também soltar o “é campeão!”. Quando o carro estava bom o suficiente, em 1999, o alemão quebrou a perna ao sofrer um grave acidente no GP Inglaterra. Foi dado como acabado. Começavam os rumores de que a reestruturação ferrarista tinha chegado ao fim sem título algum para exibir.

No ano 2000 a pressão interna na Ferrari era avassaladora. A equipe investira pesado e os resultados não vinham. Era a hora do tudo ou nada dentro da equipe. O carro, finalmente, era o melhor do grid, mas não se podia ignorar a McLaren. Barrichello chegou de mala a cuia na casa italiana. E a residência tinha dono. Ele era alemão e tinha o queixo extremamente pronunciado.

Por tudo o que fez e por tudo o que representava dentro da equipe, sendo o responsável pela guinada da Ferrari em pouco mais de 4 anos, Schumacher era Deus no time italiano. Estava claro que o papel que cabia a Barrichello era o de escudeiro, segundo piloto. Óbvio, evidente. É assim que funciona a F-1, enfim.

Mas Rubinho acreditava (ou fingia acreditar) que podia brigar pelo título. Passou a choramingar para a imprensa e a protagonizar explicações que saiam pior do que o silêncio. As vitórias vinham em ritmo lento, algumas delas frutos de circunstâncias de corridas excepcionais. Em maio de 2002 ocorreu o episódio que se tornou símbolo do ambiente da Ferrari: Barrichello foi, numa decisão infeliz, para dizer o mínimo, forçado pela equipe a ceder a vitória do GP Áustria a Schumacher, na última volta. O mundo caiu sobre a Ferrari, lançada ao panteão das vilãs da história do esporte. Barrichello não demonstrou muita preocupação: “sou um funcionário dessa empresa, e uma empresa tem que lutar pelos seus ideais”. E o escárnio envolvendo seu nome no Brasil ganhou contornos inevitáveis.

Hoje, já fora da Ferrari, Rubens Barrichello anda pensando em lançar um livro quando se aposentar. Uma biografia em que promete revelar a caixa-preta dos anos de Ferrari. Hoje Barrichello demonstra irritação com os anos perdidos na casa de Maranello. Curioso o fato de essa irritação não aflorar enquanto Rubinho era pago pela escuderia italiana.

E mais: se estava tão insatisfeito com a situação no time rubro, porque não saiu?

Balanço final, caro Grijó: Barrichello sempre foi sim, um piloto de qualidade. Uma pena que decisões e palavras infelizes o tenham levado à memória coletiva como um simples falastrão atrapalhado.

Uma Semana às Avessas

A semana que acaba trás consigo uma marca: a da surpresa. Na verdade, são duas as marcas dos 4 dias de testes no circuito espanhol de Barcelona: a da surpresa e a da reviravolta. Houve nesses dias uma constatação que promete alterar a geopolítica das forças das equipes nesse início de temporada: a McLaren parece não ter força para estar entre as favoritas e a Brawn, incógnita ambulante até a semana passada, dá sinais de que pode vir para lutar por vitórias.

Antes é sempre bom relembrar: testes de pré-temporada podem ser extremamente enganosos. Em condições normais eles costumam não dizer muito sobre o campeonato, por vários motivos. Um deles: o ano é longo, com 17 corridas e pistas com características singulares. Outro: há sempre o risco de vermos tremendos blefes da parte de equipes que querem apenas impressionar para atrair patrocinadores, e a Brawn se encaixa perfeitamente sob essa ótica. Mas o bom desempenho da equipe não tem cara de blefe, até por um motivo óbvio: os testes durante o ano foram rigidamente diminuídos e uma equipe que nasceu na semana passada não tem muito tempo a perder com pirotecnias.

Comecemos, então, pelo final... da lista de tempos. A McLaren dá pinta de não ter carro bom o suficiente para brigar por vitórias nesse início de campeonato. Desde os testes de janeiro a equipe de Woking já demonstrava algum despreparo para essa F-1 de tantas regras novas. Nessa semana em Barcelona o carro deu claros sinais de que, se não estiver escondendo o jogo para surpreender em Melbourne, Lewis Hamilton terá que trabalhar duro para conseguir desempenhos razoáveis. Uma bela oportunidade para descobrirmos se o garoto é tão bom em melhorar máquinas como é acelerá-las.

O MP4/24 da equipe inglesa emitiu um aviso inequívoco: Woking está encontrando sérias dificuldades, especialmente na área aerodinâmica traseira do carro. Durante os últimos testes a McLaren, vez por outra, aparecera com o aerofólio de 2008. Em Barcelona, na maioria das vezes, o time prateado treinou com o apêndice desse ano, menor, mais fino e mais alto, mas continuou a deixar claro que a estabilidade não é a maior virtude do carro que Woking produziu para 2009. Com poucos testes durante o ano, a equipe que iniciou a pré-temporada como favorita depois de fazer o piloto campeão no ano passado viaja para a Austrália sob olhares desconfiados do público, depois de fechar dias seguidos com tempos nada animadores nos testes de inverno.

Na outra ponta da tabela está a maior surpresa da pré-temporada. E ela tem nome e um sobrenome de peso: Brawn GP, a equipe que nasceu dos escombros da Honda, provocou enorme susto. Em 4 dias de testes o time recém-nascido liderou dois, um com Button e outro com Barrichello, que fez o melhor tempo da semana. Nos outros dois dias o time de Brackley também andou rápido, fazendo dessa semana a mais interessante da F-1 desde o último dia 2 de novembro.

Há o sério risco de que as palavras tortas desse blogueiro subestimem o fantástico desempenho da BGP. Porque o que a equipe fez nessa semana de testes foi avassalador. De um mero sonho de termos 20 carros alinhando na Austrália, a Brawn se converteu na maior surpresa que de uma pré-temporada nos últimos anos. Foi uma bomba de nêutrons jogada sem prévio aviso no mundo da F-1.

A BGP é a boa surpresa por uma série de razões e desrazões que a categoria máxima viveu nos últimos meses. Primeiro, porque a equipe emergiu de uma estrutura vacilante que, apesar de investir milhões na F-1 há anos, colheu apenas uma vitória enquanto equipe própria: a Honda. Depois que a montadora anunciou sua retirada da F-1 em dezembro, a pré-temporada tornou-se um enjoado jogo de especulações, com apenas uma certeza informal que permeava a expectativa: fosse quem fosse o comprador da estrutura do time japonês, o resultado seria um só: fim de grid em 2009. É lógico! Fim de grid era tudo com o que a nova Honda poderia sonhar porque era essa a herança que a montadora deixaria: um carro extremamente ruim em 2008 (e também em 2007). Mas, não há nada como uma mudança radical nas regras e uma mente notável para mudar um panorama.

Desde o meio do ano passado, a Honda já abandonara o projeto do seu carro. O bólido era tão lento que a equipe imaginava que seria mais apropriado focar no desenvolvimento do monoposto de 2009. Foi essa a chave para o nascimento fulgurante que Brawn viveu nessa semana. Já ciente das mudanças que o regulamento sofreria para esse ano e sendo, junto com outros líderes de várias escuderias, um dos integrantes do conselho que formulou as regras da “nova” F-1, Ross Brawn começou a projetar o carro com meses de antecedência. Foi o trabalho desse engenheiro formado na Inglaterra e notável por fazer parte de vários projetos vencedores na F-1 a principal razão para o êxito e o otimismo que rondam a atual BGP.

O resultado do esforço de Brawn não poderia ter causado melhores impressões: de segunda-feira pra cá times campeões como a McLaren caíram e a Brawn ascendeu à condição de favorita para a primeira corrida do ano, em Melbourne. Mesmo equipes que vinham bem como Toyota, BMW e até mesmo a Ferrari acusaram o golpe: “o carro da Brawn está inalcançável” – afirmou Felipe Massa, que ficou quase 2 segundos atrás do melhor tempo marcado por Rubens Barrichello na quinta-feira.

É cedo para afirmar que a Brawn vem para o campeonato. Em duas semanas os times podem aprontar pequenas inovações em seus carros. Mas a Brawn é, sem dúvidas, a melhor notícia da pré-temporada.